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LGPD e Marketing: o que precisamos saber?

LGPD e Marketing: o que precisamos saber?
Márcia Guanabara
mar. 4 - 14 min de leitura
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Hoje vamos falar um pouco sobre os impactos da LGPD, Lei Geral de Proteção de Dados, no marketing. O tema é extenso e caberia alguns livros, agora vamos falar apenas sobre os conceitos básicos trazidos pela lei e como eles se confrontam com a atual cultura que envolve as ferramentas de marketing digital.

Com o enorme crescimento da tecnologia observada nos últimos anos, as relações sociais estão migrando para o universo digital em todos os aspectos. Do contato com amigos, a compras online e até mesmo o uso de serviços públicos, todas as relações passam pela rede, por plataformas, aplicativos, mecanismos de busca. Não é mais possível interagir, comprar ou ser cidadão sem acessar algum dispositivo e expor suas informações pessoais.

A questão é que os mecanismos legais que controlam eventuais abusos nas relações sociais e buscam manter o equilíbrio entre os mais fortes e os mais fracos não acompanham o mesmo ritmo acelerado da evolução tecnológica. Isto é um fato histórico. O rápido crescimento da datificação social não foi acompanhado de perto pela legislação e o resultado é um sistema que hoje usa os dados dos cidadãos sem os necessários limites e orientações.

A proposta das leis de proteção de dados, como a LGPD, é instruir, organizar e limitar o tratamento dos dados pessoais para proteger os seres humanos de possíveis abusos e mesmo da possibilidade de acessos indevidos a informações que deveriam ser restritas. 

Há alguns a proteção de dados pessoais começou a ganhar força em vários países, com destaque para os países da União Europeia, trazendo mais que uma lista de obrigações. A proteção de dados exige uma transformação cultural e uma revisão da lógica do mercado. Seus impactos se fazem sentir em todos os setores e em todos os elos das cadeias de fornecimento.

Como é fácil perceber, os negócios e as atividades que têm nos dados seu core business serão as mais afetadas. O marketing se encontra entre estas atividades, destacadamente o marketing digital que tem o tratamento de dados pessoais como base de toda a sua estrutura.

Conceitos básicos da LGPD

Para compreender o impacto da LGPD sobre as atividades de marketing é necessário conhecer alguns conceitos básicos da legislação.

O primeiro deles é o reconhecimento do ser humano como dono de qualquer informação que lhe diga respeito. A pessoa física é a única e legítima proprietária dos seus dados. É esta pessoa que poderá ser identificada, conhecida e impactada através do uso de seus dados pessoais. Para a LGPD, esta pessoa é chamada de “titular”.

Assim como uma pessoa é dona de seu dinheiro e o deixa guardado no banco e acordo com suas necessidades e preferências de investimento, o titular é proprietário de seus dados e os entrega para que um terceiro cuide deles. Este terceiro, assim como um banco, não pode fazer nada com aqueles dados que não seja do conhecimento do titular e não respeite seu declarado desejo. Como legítima proprietária da informação, a pessoa tem o direito de saber exatamente como seus dados serão usados e, sempre que possível, concordar com o modelo proposto. A LGPD chama este direito de decisão sobre o uso dos dados de “autodeterminação informativa”.

Como o objetivo da Lei é cuidar dos seres humanos, proprietários dos dados, ela se aplica a todos os setores e entes que tratam dados de pessoas físicas. Não importa quem realize o tratamento, se pessoa física ou jurídica, o importante é que os dados sejam usados e protegidos da forma correta.

Qualquer uso de dados pessoais que tenha como objetivo a obtenção de resultado econômico ou outro tipo de vantagem está sujeito à LGPD.

Na LGPD, a palavra “tratamento” significa toda e qualquer operação realizada com dados pessoais desde a coleta até a eliminação, incluindo as ações mais simples como visualização ou o apenas armazenamento ou cópia em back up. Se o dado está em poder de alguém que não seja seu proprietário, esta pessoa já está realizando um tratamento.

A definição de “dado pessoal” é tão abrangente quanto a definição de “tratamento”. Para a LGPD, dado pessoal é qualquer informação relacionada a pessoa natural identificada ou identificável, seja de forma direta ou com a ajuda de algum tipo de inteligência ou referência cruzada.

Com base na premissa da propriedade dos dados, as legislações sobre privacidade e proteção de dados definem uma lógica sistêmica que deve reger qualquer tratamento de dados pessoais. Toda esta lógica parte de alguns princípios básicos:

  • Qualquer informação pessoal precisa ser tratada com boa-fé.
  • O dado pessoal só pode ser coletado para uma finalidade específica.
  • As informações precisam ser adequadas e restritas ao mínimo necessário para que se cumpra a finalidade especificada.
  • A informação precisa ser mantida atualizada e jamais poderá ser usada de forma discriminatória.
  • Todas as etapas da operação de tratamento devem ser transparentes, ou seja, devidamente explicadas ao titular através de linguagem simples e acessível ao público ao qual se destina.
  • A pessoa que coletou o dado será responsável por tudo o que acontece com ele e precisa prestar contas tanto para o titular, quanto para as autoridades.
  • É obrigatória a adoção de todas as medidas preventivas cabíveis para garantir o uso adequado e a segurança daquelas informações.

Além dos princípios citados acima, é importante destacar que a LGPD restringe as possibilidades para o tratamento de dados pessoais. Agora os dados só podem ser coletados e usados quando a operação estiver enquadrada dentro de uma das hipóteses previstas na lei.

Existem, literalmente, dez situações em que é possível tratar dados relativos a pessoas naturais. A lista abaixo é um brevíssimo resumo das especificações sobre cada uma delas.

Dados pessoais podem ser tratados pelos seguintes agentes em situações específicas:

1.    pela administração pública exclusivamente para execução de políticas públicas,

2.    por órgãos de pesquisa sem fins lucrativos para a realização de estudos de caráter histórico, científico, tecnológico ou estatístico,

3.    por profissionais de saúde, serviços de saúde ou autoridade sanitária para atividades restritas à tutela da saúde e

4.     por qualquer pessoa para proteger vidas em situações de emergência.

Também podem ser tratados nas situações abaixo por qualquer pessoa física ou jurídica:

5.     para a execução de contrato com o titular e a pedido deste,

6.     para cumprir obrigações definidas em outras leis e

7.     para defesa em processos judiciais ou administrativos.

O último bloco se refere às opções adicionais que fortalecem fundamentos da LGPD de “garantir o desenvolvimento econômico e tecnológico, a inovação, a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor”.

Caso a operação proposta não se enquadre em nenhuma das opções anteriores, a lei oferece as seguintes hipóteses de tratamento que, se observadas todas as obrigações específicas, viabilizam várias atividades:

8.     com o consentimento do titular,

9.     para atender a interesses legítimos do controlador e

10.  para a proteção do crédito.

É importante destacar que as dez hipóteses de tratamento não possuem hierarquia. Cada caso é um caso e a organização deverá encontrar a melhor opção para cada situação.

Esta breve descrição da lógica e das exigências da proteção de dados mostra apenas uma camada superficial desta temática que tende a se tornar global, pois esta é a única forma de permitir o livre comércio entre os diferentes países.

Além da globalização, estas legislações ainda tem a tendência de se tornar cada vez mais protetivas para o titular dos dados, exigindo maior transparência e cuidados por parte de quem utiliza os dados em suas atividades.

Trata-se de um caminho sem volta e à equipe de marketing digital é recomendável o estudo mais aprofundado, devido ao forte impacto que a lei terá no seu dia a dia. Os profissionais que tiverem o cuidado de compreender profundamente o que precisa ser feito serão os primeiros a repensar a atividade, disparando na frente no processo de adequação.

Transformação cultural

Com o que já foi exposto, é possível compreender o que será exigido do marketing digital: uma consistente mudança de raciocínio e de comportamento. O mercado não vai parar de funcionar, as empresas vão continuar vendendo e dando lucro e o marketing digital ainda será uma das ferramentas mais importantes neste mundo conectado, ou seja, será preciso descobrir novas formas de apresentar resultados em conformidade com a legislação.

Qual seria o modelo ideal? Não há formato pronto, não existe um framework mágico. Cada organização, cada profissional vai desenvolver suas próprias estratégias de adequação. O importante é atender às exigências legais. De qualquer forma, é possível listar algumas ideias essenciais para este novo olhar.

  1. O titular é o único e legítimo proprietário das informações que lhe dizem respeito.
  2. Cada pessoa envolvida em operações que lidam com dados pessoais tem sua parcela de responsabilidade sobre a conformidade do processo.
  3. O modelo da operação precisa respeitar o espaço privado e o direito à autodeterminação informativa de todos os públicos.
  4. A transparência é regra número um para qualquer tratamento de dados pessoais, pois o titular só pode deliberar sobre o uso proposto para suas informações se compreender exatamente o que será feito com elas.
  5. Dados pessoais só podem ser tratados quando houver uma finalidade específica e devidamente informada.
  6. A finalidade precisa, obrigatoriamente, estar enquadrada em uma das hipóteses de tratamento previstas na legislação.
  7. Não existe “banco de dados da empresa”, a empresa é apenas uma fiel depositária dos dados que pertencem aos titulares.
  8. Toda a cadeia de fornecimento (prestadores de serviço) deve estar em conformidade, pois cada agente tem a sua responsabilidade no compartilhamento e no tratamento dos dados.
  9. Toda e qualquer operação que lide com dados pessoais precisa ser descrita em procedimento que permita o acompanhamento, a auditoria e a prestação de contas ao longo de todo o ciclo de vida do dado.
  10. A governança do precioso ativo que são os dados pessoais é elemento chave para a sustentabilidade do negócio.

Embora estes não sejam todos os elementos que precisam estar no radar dos profissionais de marketing, já representam uma parte considerável das novas responsabilidades da atividade. Quem conseguir entregar valor respeitando os itens da lista acima, já terá conquistado considerável diferencial competitivo.

Desafios

Se há uma atividade capaz de se reinventar, esta é o marketing. Sua história é marcada por revoluções. A atividade se reinventa a cada nova tecnologia que surge, da mesma forma que se adapta a cada novo cenário regulatório. A atividade já passou pelo surgimento da TV, pela promulgação do Código de Defesa do Consumidor, pelo surgimento da internet, a tudo se adaptou e continuou em crescimento.

Não será diferente agora. Chegou a hora de repensar estratégias, modelos e técnicas, usando toda a criatividade que lhe é peculiar para realizar sua missão de forma inovadora, sem ferir a privacidade e com a proteção devida aos dados dos seus públicos. Este desafio precisa ser cobrado pelo contratante do serviço que será o primeiro responsável perante a lei.

Algumas práticas como negociação de bancos de dados, remarketing, captura de dados em bancos públicos, uso de cookies (em especial os de terceiros e de rastreamento) serão repensadas para atender às especificações da LGPD. Talvez algumas sejam abandonadas para dar lugar a inovações até mais eficazes.

É essencial enxergar a LGPD não como um inimigo, mas como um novo caminho que vai garantir a sustentabilidade da própria atividade. O marketing precisa colaborar efetivamente no processo de adequação das empresas. Devido à complexidade dos processos envolvidos na atividade de marketing, a equipe de adequação precisará de todo o apoio para ter sucesso nesta etapa.

Oportunidades

Este texto chega ao fim destacando as oportunidades que se abrem para as áreas de marketing e comunicação.

O marketing deve ser o primeiro aliado da proteção e dados definindo seus modelos de forma aberta e aproveitando para ganhar espaço dentro das organizações, inclusive na execução de dois dos maiores desafios apresentados pela lei que são a transformação cultural e a transparência tanto do público interno quanto externo.

As empresas terão pouco tempo para conquistar a maturidade na governança de dados, ou seja, para garantir que todos os processos permitam acompanhamento, gestão, auditoria e total transparência. Ninguém melhor do que o marketing e a comunicação para desenvolver:

  • seus próprios modelos de forma mais transparente,
  • formas de comunicação eficazes para sensibilizar as equipes,
  • modelos criativos para estimular a transformação cultural e
  • modelos inovadores de políticas de privacidade que realizem uma comunicação efetiva com os públicos etc.

O Direito já desenvolveu o Visual Law ou Legal Design, uma técnica que se propõe a traduzir mensagens complexas como textos jurídicos em linguagem simples e compreensível para o receptor. São empregadas técnicas de comunicação, incluindo a linguagem visual, que são mais acessíveis e adequadas para alguns casos.

Agora é a hora de o marketing e a publicidade empregarem suas habilidades para compor este esforço de tornar transparente para o público a forma como seus dados são tratados, ajudando no esforço pela transformação cultural tão necessária para empresas e para toda a sociedade.

Originalmente publicado pelo blog da Nextlaw Academy em 19/9/2020.

 

 

 


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Márcia Guanabara

Publicitária, Guanabara Consultoria e Gestão Ltda.

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